O momento mais pesado do calendário do Futebol Brasileiro

futebol brasileiro covid

O calendário do futebol brasileiro é dos mais insanos em todo o planeta. A existência de longos campeonatos estaduais, que ocupam mais de três meses do ano, incha a rotina de jogos dos clubes, que chegam a disputar perto de 80 partidas em uma só temporada. São dezenas de jogos a mais do que os times europeus costumam realizar em períodos iguais. A carga é pesada e tem, evidentemente, consequências no rendimento dos atletas e na qualidade do jogo.

Em 2019, quando Flamengo e Liverpool se enfrentaram na decisão do Mundial de Clubes, em Doha, o time brasileiro completou no Oriente Médio 74 jogos oficiais na temporada, que no Brasil vai do começo ao final do ano. A equipe inglesa estava na metade, já que na Europa se joga de agosto a maio, aproximadamente. E quando completou seu período 2019/2020, os comandados do técnico Jürgen Klopp alcançaram 57 pelejas, 17 a menos do que os rubro-negros.

Os Reds chegaram a essa marca por terem disputado o torneio da Fifa e avançarem em certames eliminatórios. Mas na Premier League, o campeonato nacional de primeira divisão que os ingleses disputam, equipes que não estavam em competições internacionais e tampouco conseguiram avançar em torneios domésticos no formato mata-mata fizeram muito menos jogos. O Brighton & Hove Albion, por exemplo, atuou 41 vezes e o Crystal Palace apenas 40.

Com a pandemia do novo coronavírus, o cenário obviamente se complicou em todo o mundo, no Brasil ainda mais. Mas isso não significou mudança alguma na rotina das agremiações, que paralisaram suas atividades em março de 2020, voltaram meses depois, terminaram os certames dos Estados, emendaram com:

  • Campeonato Brasileiro
  • Copa do Brasil
  • Copa Libertadores
  • Copa Sul-americana

Os compromissos foram colocados na agenda naturalmente, como se não houvesse o problema mundial.

Argentina tem calendário mais leve

O caso é tão complexo que até na Argentina, que tem dirigentes de futebol muitas vezes ainda mais confusos do que os brasileiros, os times fazem um número menor de partidas a cada ano. Por isso houve melhores condições de reorganização da agenda futebolística, embora lá os engravatados não tenham aproveitado a chance. Mas é fato que os times argentinos não encaram maratonas de jogos minimamente parecidas com as dos vizinhos.

gremio

Palmeiras e Grêmio, justamente os dois finalistas da Copa do Brasil 2020, encerrada apenas em março de 2021; foram os dois que mais entraram em campo no ano passado após a paralisação forçada pela pandemia do novo coronavírus.

Gremistas e palmeirenses jogaram no segundo semestre a cada 3,5 dias, aproximadamente, com raras semanas livres de treinamentos. Um ritmo tenso que nenhum grupo de jogadores consegue suportar em boas condições.

palmeiras

Isso apenas até o final do ano, porque a série de jogos continuou em janeiro. No caso do Palmeiras ainda teve uma viagem ao Catar para a disputa do Mundial de Clubes, estendendo-se até o terceiro mês do ano, com o duelo entre os dois pelo título da Copa do Brasil. A situação chegou ao cúmulo de, entre os dois jogos decisivos pelo certame eliminatório nacional, alviverdes e tricolores terem entrado em campo para compromissos por campeonatos estaduais, no caso do time paulista, um 2 a 2 com seu maior rival, o Corinthians.

É realmente incrível que, mesmo em temporada mais do que atípica e com o vírus ainda presente, infectando mais pessoas, matando mais do que nunca no Brasil, e consequentemente inviabilizando a volta do público aos estádios, o calendário não sofra qualquer adequação. Simplesmente as federações estaduais não cederam, não deram a sua contribuição ao futebol encurtando os campeonatos que promovem, o que aliviaria, muito, a situação. E a CBF apenas as apoia.

Camisas pesam mais do que Estaduais

pandemia esporte

Claro que os clubes menores precisam atuar, a eles, em muitos casos, falta calendário, ficam sem jogos, sem competições, sem condições de manter os seus elencos. Então por que não adaptaram essas competições à atual realidade? O desinteresse das emissoras de televisão pelos campeonatos dos Estados é evidente, os valores por elas pagos caem e a audiência idem. Se ainda conseguem ter algum apelo, é por ficarem isolados em parte das datas que ocupam.

Quando grades clubes do futebol nacional colocam suas equipes em campo, eles chamam a atenção. Se não há partidas por certames mais relevantes, como o Brasileirão e a Libertadores, ou mesmo a Copa do Brasil, evidentemente essas camisas chamam a atenção para os Estaduais. Não, realmente não são essas competições que atraem o público, as atenções da torcida, mas sim os times que delas participam. Eles carregam esses campeonatos nas costas.

Há quem diga que, na pandemia ou sem ela, não existem soluções para o problema. Não é bem assim. As federações deveriam promover competições dentro de suas jurisdições ao longo do ano, entre os times que estão fora das quatro divisões do Campeonato Brasileiro. Seria uma maneira de manter em atividade atletas e demais profissionais que, ano após ano, ficam sem emprego quando os Estaduais acabam, entre abril e maio. Isso justificaria a existência dessas entidades.

Se elas tivessem essa preocupação e subsidiassem os certames dos pequenos ao longo do ano, manteriam esses elencos em atividade, preservaria empregos. Poderiam colocar como objetivo para quem disputasse tais competições as vagas na Copa do Brasil e a chance de enfrentar os grandes e demais clubes como presença em divisões do campeonato nacional. Com isso, ao invés de 18 datas, essas competições que deixam o calendário inchado não ocupariam mais do que um mês.

Seria uma pré temporada, uma maneira de colocar em jogo um título, de preparar os times mais fortes para os maiores desafios, mantendo os menores em atividade.

Na Inglaterra, por exemplo, os da Premier League jogam entre si e os da National League, quinta divisão, da mesma forma. Eles, como os demais, até de níveis abaixo, enfrentam os mais fortes apenas quando na Copa da Inglaterra ocorre um cruzamento, o que depende de sorte, azar e desempenho.

Assim, sem política, mas com atitudes razoáveis, seria possível reestruturar o futebol nacional, desenvolver um calendário que beneficiasse o esporte, não mais esse, que estrangula. Mas se nem mesmo em meio à pandemia do novo coronavírus os dirigentes resolveram o problema, pelo contrário, o acentuaram, nada nos dá esperança de que os modelos bem sucedidos de outros países sejam, um dia, adotados no futebol brasileiro.

2 Comentários

  • Dennis Ribeiro
    17 março 2021 às 17:15

    Mauro, os dirigentes tanto reclamam da janela de transferências que tanto prejudicam os clubes e o incrível que em momento algum não ouvi nenhum dirigente de clube ou sequer jornalista dando a ideia para que o futebol brasileiro se adaptasse à temporada européia, com campenatos indo de agosto à maio, foi uma oportunidade de ouro jogada fora. Acho que teria sido uma boa se a CBF e clubes tivessem aproveitado o transtorno que a Pandemia causou e tivessem mudado nosso calendário e feito uma adaptação melhor de datas e campeonatos.

    • Mauro Cezar
      24 março 2021 às 09:48

      Olá Dennis,

      Sem dúvida, uma grande oportunidade foi desperdiçada. Depois dessa chance perdida podemos concluir que não acontecerá jamais. Abs!

      Mauro Cezar

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *